3 poemas de Maria Mortatti

Ilustração: Brooke Shaden
 
SABOR DE DESPEDIDA
 
                 
              Mote
Um toque de afeto e língua
com sabor de despedida
é um mote de glosa à míngua.
 
                                                    
                                                     Voltas
Mesa posta, cama feita,
paciente eu te esperava,
como à chuva a semente.
— Amor, a que vieste?
— Mostrar-te o gosto da vida
num toque de afeto e língua.
 
Quem do meu prato comeu
e em minha cama deitou
sorveu-me com gula a seiva.
— Amor, por que me trais?
— Para em vida provares
o sabor da despedida.
 
Cerrada a boca e o peito,
cumprido o tempo em seu fruto,
as folhas caem no chão.
— Vida, por que te vais?
— Não há mais volta, se o amor
é um mote de glosa à míngua.  
 
(Do livro Breviário
amoroso de Sóror Beatriz
– Editora Patuá, 2019)
 
 

SABOR DE DESPEDIDA

                  Mote
Um toque de afeto e língua
com sabor de despedida
é um mote de glosa à míngua.

                                                     Voltas
Mesa posta, cama feita,
paciente eu te esperava,
como à chuva a semente.
— Amor, a que vieste?
— Mostrar-te o gosto da vida
num toque de afeto e língua.

Quem do meu prato comeu
e em minha cama deitou
sorveu-me com gula a seiva.
— Amor, por que me trais?
— Para em vida provares
o sabor da despedida.

Cerrada a boca e o peito,
cumprido o tempo em seu fruto,
as folhas caem no chão.
— Vida, por que te vais?
— Não há mais volta, se o amor
é um mote de glosa à míngua.  

(Do livro Breviário amoroso de Sóror Beatriz – Editora Patuá, 2019)


EXPLICAÇÕES PÓSTUMAS

Te chamei:  — Vem!,
porque o tempo de espera
anunciava a revelação do amor.

Te nomeei: — Amado!,
para não ter de a cada momento
recontar a história da criação do amor.

Te pedi: — Fica!,
porque julguei que o desejo bastasse
para as necessidades do amor.

Te disse:  — Não!,
para que a ilusão da posse
não embaçasse as urgências do amor.

Te perdi: — Adeus!,
quando compreendi a incompatibilidade dos códigos
na decifração da linguagem do amor. 

(Do livro Breviário amoroso de Sóror Beatriz – Editora Patuá, 2019)


PROVA DE FRANCÊS
                                  (quase parlenda)

De passagem por minha terra natal, certa vez,
soube que lá vivia como camponês,
de olhos azuis por trás do pince-nez,
com um sorriso sempre cortês,
um solitário professor francês,
que, ao me ver, perguntou em confuso português:
— Quem é essa mulher bonita?

Ter-lhe-ia ofuscado a visão, talvez,
o mesmo sol que abrasou sua tez?
Ou estes tórridos trópicos derreteram-lhe a sensatez?
Mas não sei se por timidez,
ou por narcísea embriaguez,
fui-me, sem nem querer saber seus porquês,
sem nem lhe agradecer pelo bem que me fez:
ainda que em tardia primeira vez,
sem temer nenhum revés,
pude responder, com sentido e altivez,
àquela antiga pergunta da prova de francês:
— Je suis une belle femme!

(Publicado em revista Linha Mestra,  Associação de Leitura do Brasil, 2007)
 
 
 
 
 Maria Mortatti nasceu em 06/11/1954, na cidade de Araraquara/SP, onde estudou desde o curso primário até a graduação em Letras. Entre 1978 e 1991, atuou como professora de língua portuguesa e literatura na rede pública estadual de ensino e concluiu mestrado e doutorado em Educação na Universidade Estadual de Campinas. Em 1991, iniciou atividades como professora universitária e pesquisadora, estando hoje vinculada, como professora titular, à Universidade Estadual Paulista – campus de Marília. Além de contribuir para a formação de milhares de professores e dezenas de pesquisadores, publicou livros, capítulos e artigos científicos sobre ensino de língua e literatura e recebeu o Prêmio Jabuti – Educação em 2012. Há mais de quatro décadas, escreve também textos literários, como os reunidos em “Breviário Amoroso de Sóror Beatriz” (Patuá, 2019), seu livro de estreia como poeta. B

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