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Ilustração: Iman Maleki |
ALÉM DA MEMÓRIA
Do outro lado
a janela não parece fechada,
mas aberta na imaginação
em esperança de um dia
o acordar prossiga em sonho
Permanecer em sempre
parece a sombra do desejo
volátil, em forma de não
Encontro permeado de desatino,
perdido nas ondas calmas
da mais antiga tempestade
E, enfim, depois da brisa fria
de outros junhos
não vale apenas a certeza:
É sonho, é vida, é o ar cercado de fumaça,
encontro do nada a refletir
sobre as cinzas do outro dia
Desatino além da própria memória,
retorno inerte do esquecimento
e de nada adianta lembrar,
a vida solta de si mesma
leva consigo a vitalidade do tempo
num desafio inconteste e invencível
E resta, além do espelho,
a vontade de persistir
além do que não se pode ver:
Vôo cego da memória
por entre as sombras
nem sempre más,
mas sempre sombras.
ADÁGIO
Não sei
até quando
devo procurar
Há tempos
o destino deixou de ser
o mais importante
Agora
o que mais importa
são os caminhos
De nada adianta
a glória da chegada
sem perceber a beleza do percurso
Não tenho pressa:
sei que vou encontrar
o que procuro
Hoje eu sei.
MEMÓRIAS
ESPARSAS
ESPARSAS
O meu passado é um sopro…
Sobrou tão pouco
Alguns retratos, memórias esparsas
Músicas e cheiros que se confundem pelo ar
E a cada vez que olho pra trás
Vejo que sei muito pouco
Sobre mim
E que, ainda assim,
Sinto muita saudade.
O
DIA DA MARMOTA
DIA DA MARMOTA
Quando esse dia terminar
Talvez algum sentido
Tiremos do absurdo
O susto, o pânico, a incerteza
Parecem mais confiáveis
Que a ciência e a racionalidade
Presos, acuados
Colhemos os despojos
Que o mundo sopra contra nós
Quando afinal esse dia terminar
Só terá valido à pena
Se o medo enfim nos ensinar.
ANDRÉ GALVÃO: Mora em Amargosa-BA. Mestre em Literatura pela UEFS e Doutor em Ciências da Educação pela Universidade do Minho (Portugal). Coautor do livro de poemas Redescobrir-se: poesias de fim de século pelo Selo Editorial Letras da Bahia / FUNCEB (1998) e do livro Crítico Intrépido! Filósofo Tímido? Sílvio Romero e o ensino secundário de Filosofia no Brasil, pela Editora CRV (2018). Autor do livro de poemas A Travessia das Eras, pela Editora Penalux (2018) e do livro O Coronelismo na Literatura: Espaços de Poder, pela Editora UFRB (2018). Participou de antologias literárias no Brasil e em Portugal. Associado ao NALAP – Núcleo de Artes e Letras de Portugal e membro da ANE – Associação Nacional de Escritores (Brasil) e da Academia Independente de Letras (Brasil).