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O SILENCIO DA PAISAGEM
É nesse cemitério verde, de flores mortas,
de frutos vindouros e caídos,
que a memória do sol percorre
a vereda dos cipós retorcidos.
É nesta cama de palha seca
que os lençóis do vento
se esvoaçam e rodopiam
no balé das folhas.
É desta raiz mergulhada
no suor da terra que a mão da coragem
alcança os galhos do amanhã.
É nesse pouso de pássaro
que a voz da chuva bate as asas e some
no meio do azul esverdeado dos cocais.
VOUYER
O clarão da fogueira
acaricia o dorso das águas.
A correnteza,
por entre galhos e folhas,
deixa escapar um gemido indecifrável.
Pequenas ondas lambem os seixos
arrepiando a pele enluarada da areia.
Cigarras, sapos, grilos, macacos,
lobos guarás e peixes,
Indiscretamente,
lascivamente,
naturalmente bolinam a noite
com seus cantos,
coaxos,
cricrilos,
assobios,
uivos
e roncos.
( no meio dessa escuridão fria e erótica
o fogo violáceo da tiquira me queima)
NO ESTOMAGO DA ETERNIDADE
As pouquíssimas árvores ribeirinhas
bebiam o pensamento do rio,
e o rio não entendia a fogueira dos pescadores
que assavam a escassez dos peixes.
Os peixes se debatiam na rede do tempo
e o tempo dormia na areia branca da noite
e a noite lambia o sonho dos animais,
(com exceção o homem, que perdeu a receita de sonhar)

VIAJOR
Adormeci em pé
no meio do azul
espiando o planar dos pássaros
e a fuga das ideias.
Na profundidade do sono
não vi o barco passar,
o muro cair,
o rio secar,
a laranjeira florir,
a morte cochilar na vereda e sumir.
Na agonia do meu despertar
me vi soterrado pelo lodo dos risos,
gritos, silêncios e a incerteza do caminho
que a correnteza percorreu
ao me arrastar pelo mundo.
PREVISÃO
A pedra do indecifrável
rola morro
a
b
a
i
x
o
e morre no nascimento do sol.
Calmamente,
o calango antigo do olhar
devora o mosquito do amanhã.

Me chamo José Maria Carvalho da Silva, nasci em Vargem Grande –MA, ainda jovem, antes de completar os meus estudos, viajei Brasil afora, como a maioria dos meus conterrâneos nordestinos fizeram nos idos dos anos 80. Conheci o Pará, um pouco de São Paulo, Manaus, e morei também em Roraima. Depois de tantos anos voltei pra casa, completei meus estudos e hoje sou professor concursado e atuo na rede pública de ensino do meu município. Acho que a poesia foi pra mim antes de tudo uma forma de sonhar o mundo que eu suspeitava existir, porém, depois que viajei Brasil afora e conheci tantos personagens, vi e vivi situações diversas, a poesia passou a ser também o meu pesadelo e refúgio, pois, é com as palavras que recrio o meu mundo perdido ou talvez vivido, pra ser mais exato.