VIAGEM
Viajo pela arte decomposta: remédios
receitados ao doente (enganado corpo
atravessado em doenças): altero o estado
e fico junto ao corpo (a dor da espera
multiplicada no repetir do quadro)
na arte recomposta em traços de reconhecimento
pelo tempo em que fomos jovens
(ao redor do corpo circulam indecisas
orações e lágrimas).
SENTIR
Árido sentir: seco
ressecado
assustado do próximo
passo na aproximação
abro a porta e permito o ingresso
do desassossego
abro as janelas e consinto a entrada
da avalanche
solto as amarras e tenho o encontro
dos corpos.
ALÔ
Avanço contra o escritório
destroço mesas
e aparelhos telefônicos
alô quem fala?
alô que barulho é esse?
alô alô alô…
no tempo desperdiçado
aviso ao contratempo
sobre a escalada
dos aparelhos guardados
em caixas inofensivas
na aparência:
alô alguém aí?
alô alguém ainda por aí?
ÁPICE
No ápice do sucesso
percebe o apagar
das luzes
reflete a escuridão
em que se aventura
longe do futuro
o tempo disponibilizado
no alargar da terra
ao largar a terra
no largo abraço de despedida
o ápice recontado
prepondera no corpo
estendido: nas cobertas
o frio esquecimento.
EFEMÉRIDE
Na efeméride o fundo falso afasta
o sentido da insegurança
o féretro sai do corpo principal
fechando a porta da capela: orada
onde em imagens sou sacralizado
o infausto gesto é a briga
de abrigadas desavenças
no obrigatório fundo
falso: inconsentido
no cadafalso cabem penúltimas
razões: a efeméride se completa
em lapsos.
Ilustrações: Kandinsky Vasily
.
Uma resposta
Uma pena. Eu só soube por aqui. Ele sempre enviava e-mail para mim com poemas. Até estranhei que havia parado. Cada um tem a sua hora. Que tenha ido em paz.