energia estética
Na falta da possibilidade
Da troca de energia estática
Nos encontramos na troca
De energia estética
O despertar da kundalini
Via zoom, por mais improvável
Que seja, segue sua marcha
Estamos reinventando
As formas de conexões
Tomo doce, cogu,
Chapo forte na ganja
Tereré e muita água
Ouço sets memoráveis
E quando consigo uso o chat
Ou discord
Na festa safada, organizada
Por amizades florescidas no online
Avança vertiginoso o entra e sai de salas
E até eu, que sempre fui low profile,
Abro com gosto minha câmera
E me amostro com o pau de fora
Antes
Me lavo com cuidado
Me lambuzo no hidratante
Me perfumo, me maquio
Me posiciono e me permito
Viver no espaço do enquadramento
Fechado da minha webcam
Muita coisa que fora dele
Não vivi
Brincam os dedos,
Nos lábios, na cadeira, na parede
Deslizando pra dentro do elástico da cueca
Brincam no cu, nas bolas e no entorno da cabeça
A outra mão acaricia a roupa já tirada
E tem hora que a roupa vira buceta
Tem hora que vira rabo
Tem hora que nuca
Pra brincar de pinto
Pego meu dildo
E faço um tour pelo meu corpo
Olho pra dentro da câmera
E sei que do outro lado
Tem almas transpassáveis
O virtual
Tá cheio de gozo
Pra quem mergulha
Eu sigo encharcado
E você, vem?
épico disfarçado
boa parte das batalhas
mais sangrentas e demoradas
fazem morada em pequenezas
seja o desafio de estar acordado
quando o olho não quer deixar
ou quando ele fecha, mas tropeça
numa insônia
lutinhas, que vertidas num poema
que lido ou escutado
dificilmente será considerado
épico
mas que é
é
o que pode?
um código binário
não fede
não cheira
que gosto guarda
a alternância entre zero
e um?
como se toca o corpo
de uma sequência numérica?
o que pode um código?
o que pode
um código?
o que pode?
pode?

pedido para entrega
_ oi, eu queria fazer um pedido para entrega:
eu queria mais entrega
pode ser em qualquer campo
pode tirar o medo?
eu queria que fosse como antes,
pode ser?
eu queria… nem sei dizer
eu queria tanto!
eu quero tanto, sabe?
acho que eu não preciso explicar, né?
_ pode botar:
óleo, franja, umidade
pode embalar
sono, som
pode voltar atrás
pra sempre
até não poder mais
pode TUDO
meu caro
minha cara
só não desliga
eu preciso de você
desesperadamente
te amo
desde não sei quando
_ eu te liguei pra fazer um pedido:
vocês estão funcionando hoje?
alô? alô?
oi?
***
Sigo julgado por ações vis
Que nunca cometi.
Na miúda, outras mil
Escapam ao veredito.
Estas encaro
Sem o medo que te move
Ao que não
Te diz respeito.
Não me venha com sermões.
Não tô pra brincadeira.
Se te espanta minha falta de sorriso
Saiba que sei bem quando devo
Me levar a sério.
E você?
vidalinha
Ao som do último rap guarani
Transmitido via Bluetooth
Do smart pras caixas da sala,
Lavo louça.
Lá fora, a loucura climática
de São Carlos:
Chove esfria venta esquenta.
Como se uma lavada de louça atravessasse estações,
Como se a vida fosse uma linha esticada.
Es ti ca di nha.
Toca a campainha,
Que ainda antiga,
Interfere
na transmissão do feat
com Kunumi MC.
Como uma flauta hipnótica
Que embala, embola,
A campainha joga a ponta do fio de linha sobre seu passado,
Que insiste em reclamar existência,
Ainda que precária.
Se o tempo fosse vida linha,
qualquer puxada levaria
a ponta a sair da dianteira
pra com o resto de si
emaranhar.
Se o tempo fosse mesmo assim,
seria a vida linha?
Como pode, com esse tempo lá fora,
alguém tocar a campainha?
Mira, escuta!

Anderson Petroni (26/02/1985, São João da Boa Vista – SP). Formado em Bacharelado em Imagem e Som e em Filosofia pela UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), tendo trabalhado como editor de vídeo na TV União, de sua terra natal, e posteriormente como auxiliar administrativo na Prefeitura Municipal de São Carlos. Tornou-se depois servidor público federal, atuando como assistente em administração no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), campus São Carlos. Já ofereceu oficinas e atividades poéticas em instituições culturais e de ensino sobre haicais, poesia blecaute e o cenário de publicações independentes. Ativista vegano e integrante da equipe de organização de duas edições da SancaVeg, feira vegana realizada nos anos de 2018 e de 2019.