A névoa dentro da nuvem III – Marcelo Ariel

cena de “Senhores do Crime” de David Cronenberg
A criação do mundo segundo o esquecimento (germinação)


domingo:
   
há a recuperação da dignidade de uma ex-interioridade que atravessa todos os opaciamentos éticos do mundo humano-extinto em um momento de filme que lembra muito a firmeza também ética extinta dos passos do Cristo-tigre-Rosa de Pasolini atravessando os campos árabes. A vantagem aparece em outro filme Cinturão vermelho de david Mamet como uma recuperação do valor do ato-em-si que foi tocada com facas pontudas por noções de honra e dignidade e isto está acontecendo dentro da atmosfera laica do universo das artes marciais e do faroeste. Aqui os limites entre uma e outra interiori-dade também são atacados pelo sagrados mas ao serem transfigurados pela vagueza de afetos condicionados por forças nomeadoras, se tornam opacos.


domingo:

Woody Allen deveria ter filmado isso

gogol foi o primeiro a chamar um romance de ‘Poema’ (hoje o Lobo Antunes um discípulo seu que mistura as vozes faz o mesmo com menos humor e igual refinamento místico gogol transforma o humor em poema e muitos que o acusam de realismo não se dão conta de que aqui a reali-dade foi ultrapassada e transfigurada em Poema humo-rístico. Almas mortas é o melhor livro de humor de todos os tempos, é como se groucho Marx se encontrasse com diderot dentro do cérebro de Flaubert.




domingo:

Contra o nazismo psíquico

Ora, o objetivo da arte é a aniquilação do Estado centralizador e totalitário e não a criação de um símile dele no mundo da cultura. A destruição do Estado maquete das potências comuni-tárias e de suas negociatas será o início da era de ouro da vida do espírito em autopoiesis. tudo aquilo que submete a criação e organização de desejos e vontades comunitárias ao crivo da oficialidade e do status das negociatas é nazismo psíquico, hitler

éo pai dos ministérios de cultura, Mussolini é o pai das secreta-rias de cultura, a famosa frase de goebels: ‘Quando ouço falar em cultura, saco meu talão de cheques’ é a base e o vetor para o nazismo psíquico praticado pelo mundo empresarial com o apoio e incentivo do Estado.

Patrocínio é controle. A verdadeira arte laica e sagrada deve guardar uma distância segura, talvez de anos-luz de toda e qual-quer oficialidade controladora, de secretarias e ministérios de cultura e de departamentos de marketing de empresas. Quem patrocinou a dança dos dervixes de Ashikhabad? E o canto dos Lamas da Mongólia? E o Dao De Jing, A Linguagem dos Pássaros,


domingo:

Lâmpada no gelo

david Cronemberg é um cartógrafo das metamorfoses humanas desde ‘gêmeos: mórbida semelhança’ sua câmera tem procurado os indícios do apagamento do ser dentro deste ente que se perde dentro da máquina a ponto de se confundir com ela, de ser dissolvido por essa máquina de controle e formatação do ilusório, neste ‘Senhores do crime’ ele chega a uma síntese do homem–máquina e aponta para a visão de uma paradoxal dupli-cidade que na cena final aparece como uma pergunta do próprio caos ecoando dentro do torpor da vida, ali onde o afeto é a única luz que faz a chave girar.


Extraído de “A névoa dentro da nuvem” (Lumme Editor, 2017).


Marcelo Ariel é poeta, performer e ensaísta.Autor dos livros RETORNAREMOS DAS CINZAS PARA SONHAR COM O SILÊNCIO ( Patuá) , COM O DAIMON NO CONTRAFLUXO ( Patuá ), JAHA NANDE NAMONBOVY’ A  ( Penalux) entre outros.





Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *