“Possuímos a arte para não perecer com a verdade” – Friedrich Nietzsche
Os homens já não dizem do fogo,
com sua ciência rude,
música da guerra.
O canto reforça a crença:
guerra é a sua ciência.
Os homens não dizem do fogo,
desconhecem a arte.
CAMINHO DAS PONTES
O que é aquilo
que grita ao longe?
E vemos os séculos
em caminhos ocultos,
ao som das pontes.
De onde vem
este som oculto?
E vemos as pontes
gritando ao longe
o caminho dos séculos.
CANTO, GUERRA, LABIRINTO
O sangue do mar
faz seu labirinto
de guerra e canto.
Invocar a beleza é inútil,
as mãos bruscas do tempo
buscam alento
nas coisas antigas,
e o homem, como a pedra,
dorme no remoinho e na vida.
O canto dos homens será inútil
neste remoinho,
e as ondas, como as pedras,
buscam-se no labirinto.
Mesmo a guerra será inútil,
o sangue brusco
dormirá no tempo,
as mãos invocarão o alento
no mar, no sangue,
nas coisas antigas,
e ainda será inútil,
como a beleza inspirada de uma vida.
ESTAÇÕES
A palavra pensa a palavra.
Apenas os cegos gritam meu nome.
As horas inauditas
são pontes que evocam a vida.
Eu, cego no nome,
vejo a noite, feito um rito,
consagrar seu ato
pelo tempo impossuído.
A procissão de cegos
E musas implacáveis
Grita meu nome, e seus périplos
São meus medos, minha vingança.
Não há como acompanhá-los na selva escura
De todos os símbolos, ainda assim
Beijo-os loucamente por minhas luas.
Aplaudem-me, nos recessos mais fundos
De minha angústia, aplaudem-me,
Crepusculares, com mares e violinos,
Incendiando o clamor
Das vozes mais férteis, das margens.
Sabem que temo, por isso me amam
E me torturam.
Ilustrações: Felipe Stefani.
André Setti é poeta, professor particular de inglês e tradutor há mais de 15 anos. Publicou Teatro das Horas pelas Edições K (2005). Tem poemas publicados em revistas online como a Zunai, Prosa Verso e Arte, Desenredos e Bestiário/Máquina do Mundo. Reside em São Paulo (SP).