Coluna Luís Palma Gomes: Simplicidade

Ilustração: Thomas Lamb

A simplicidade não é fácil: importa discernir o que é demais, caminhar apenas na vereda do essencial, retirar os excessos do bloco de pedra até encontrar a escultura ideal — são atos de sublimação, de inteligência e, muitas vezes, de pura genialidade.
 
A tentação é sempre a de acumular em vez de selecionar, de deixar ficar porque “até fica bonito”. Então, no final da criação,  quem a olha, quem a lê, quem a ouve, perde-se nos detalhes, distrai-se com o supérfluo, sem conseguir concentrar-se no que devia ser imprescindível.
 
O mundo está cheio de entretenimento para que se possa enganar o tédio, esquecer a nossa lembrança da mortalidade.

 
Lisboa, 02 de agosto de 2025


Luís Palma Gomes nasceu em Lisboa, em 1967, e cresceu na periferia, em Queluz — entre linhas de comboio, pequenos quintais e o rumor longínquo da cidade. Engenheiro informático de formação, é hoje professor de Informática no ensino secundário. A escrita, porém, sempre lhe correu em paralelo, como um rio subterrâneo. Começou a publicar nos anos 90 no suplemento DN Jovem, onde os primeiros poemas encontraram lugar. Poeta do intervalo e da fricção, escreve a partir do quotidiano, da contemplação das pequenas coisas, dos gestos que passam despercebidos.  Publicou Fronteira em 2022, e O Cálculo das Improbabilidades em 2025, onde aprofunda uma linguagem feita de tensão entre o visível e o indizível, entre a matéria e o símbolo, entre a casa e o mundo. É também autor de peças de teatro, como A Moura e O Último Castro Antes de Roma, onde a memória histórica se cruza com as inquietações humanas. Escreve e ensina jovens, porque precisa de ver crescer alguma coisa — nem que seja uma imagem, uma ideia, uma manhã, uma vontade. Não tem medo da água fria do mar.

Respostas de 6

  1. Simplicidade é uma idea, uma fantasma. Sao muitos querem chegar mas o caminho ta cheio de arbuste e picos e pedras entrarem no calçado. Nem no meu ramo prificional (serralharia civil) tenho projetos simples. Sempre serralharia selvagem.

  2. A simplicidade é ficar só o que realmente importa. Ela é que nos leva ao equilíbrio, menos compromissos, mais tempo para o que realmente é essencial.

  3. A simplicidade dá muito trabalho e é uma complicação para muitos de nós.
    Para outros é natural e é apenas viver e deixar viver.

  4. Diz Isabel Allende que é comum um autor apaixonar-se por uma frase a ponto de ser incapaz de a retirar de (uma) cena mesmo que esta nada lhe esteja a acrescentar. Isabel Allende, segundo assegura, tornou-se implacável na arte de cortar o excesso, o supérfluo, o que apenas decora. Mas é normal que isso seja mais fácil para ela do que para outros autores, dada a sua passagem pelo jornalismo, onde cada texto se quer reduzido ao osso, à essência. Creio que aquilo a que a escritora chilena se refere e o que Luís Palma Gomes toca neste seu texto são uma e a mesma coisa: a busca da simplicidade resultante da depuração, com a consciência de que simplificar pode ser tarefa bem mais árdua do que parece num mundo onde cada vez mais o laço e o papel de embrulho levam a palma até ao próprio conteúdo que envolvem…

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *