
Lembro a primeira vez que reparei na peruca de Fux. Na verdade eu não reparei em nada, fui convidada a observar. Isso já faz anos, na época em que antecedia a prisão do Lula. Minha mãe adentrou a cozinha dizendo: Tu acha que Fux usa peruca?
Até então eu nunca tinha dado a devida atenção à herança que Zacarias havia deixado para o magistrado. Acho que naquela época sua figura ainda não era assim tão exposta. De lá pra cá muita coisa aconteceu e essa semana eu fiquei me perguntando: E se a peruca do Fux falasse? Será que ela nos contaria o que se passa naquela cabeça? Será que ela ficou lisonjeada ao ouvir do advogado de Mauro Cid que o ministro era amoroso, simpático e atraente? Imagina ela toda prosa, dizendo: Se não fosse eu nessa cabeça, talvez o discurso fosse outro.
Me pergunto se a peruca falante que o acompanha há tanto tempo o lembraria de quem lhe indicou ao Supremo e ainda de quem já o ameaçou não faz muito, quando ele presidia o STF. Será que o problema é que quando o ministro coloca a cabeça no travesseiro, a cabeça está desnuda e isso faz com que os pensamentos intrusivos à baixa temperatura assumem o controle daquela mente? Ou ainda será que a postura vacilante vem da certeza de que em uma democracia a peruca será preservada, mantendo seus direitos e em caso de, no futuro, uma ditadura ser instalada nesse país, a despeito de todos os esforços, tema a vingança com a supressão do acessório? Veja o que aconteceu com Teori Zavascki em uma democracia, talvez o ministro receie pela segurança de sua peruca e sua tímida careca.
Pare e pense a que ponto a história nos levou. Provando que a Terra plana não gira, ela capota; a semana que passou e a que está por vir nos fazem assistir à destemida careca de Alexandre de Moraes, indicado por Temer, tentando trazer para a realidade a peruca de Fux, indicado por Dilma.

Malvina de Castro Rosa é de Porto Alegre. Escritora, relações públicas e mestra em design estratégico, publicou os livros As loucas aventuras da guria maluca (crônicas, 2013), Paralelos Cruzados (2021), seu primeiro romance, e Crônicas de um fim do mundo antecipado (2023), no qual reúne crônicas do blog semanal que mantém há mais de quatro anos, www.bomdiasociedademachista.blogspot.com. Em 2024, lançou a coletânea de contos Em nós. Atualmente, é editora assistente na Caravana Grupo Editorial, no Brasil, e editora-chefe da Caburé, na Argentina, além de conselheira da revista Vinca Literária.
Instagram @malvina.rosa