
Imagem: Abaporu, Tarsila do Amaral, 1928
Fiquei sabendo da separação de uma amiga e fiquei surpresa. Não que eu achasse o marido o cara mais legal do mundo, pelo contrário, ele é um chato. Tampouco achava ela super feliz naquele relacionamento. Não tenho problema algum com separações. Acho que a estranheza vinha da lembrança do casamento deles, parecia que tinha sido ontem, embora faça quase duas décadas. Uma festança, uma gastança de dinheiro que eu, canguinha, sempre acho um exagero. Mas por amigas e festa open bar a gente faz coisa que nem acredita, até ficar toda empetecadinha para não destoar da decoração.
Para a ocasião comprei um vestido legal, arrumei meu cabelo e me maquiei em casa naquele estilo “passei a tarde no salão” como só uma mulher de uma família cheia de mulheres sabe fazer. Quase pronta, resolvi me olhar no espelho, mas eu não tinha um de corpo inteiro. Então, fiz o que muitas vezes já tinha feito e não tinha dado errado. Subi na privada, no vaso sanitário ou como chamamos aqui no RS, na patente, para me enxergar no espelho de cima da pia. Quando eu tava ali de pé admirando minha produção doméstica com cara de salão de bairro, a tábua escorregou e eu enfiei o pé dentro da patente. Quatro dedos entraram no cano, mas o dedão se negou a participar daquele acidente ridículo e dobrou 90 graus (talvez mais). Naquele dia meu dedão passou a ser conhecido por “dedão da patente”. Tirei meu pé molhado, aliviada de não ter quebrado o vaso sanitário. Ufa! Passei a vida ouvindo do meu pai dizer: “Guria não sobe na patente que esse negócio quebra e tu te pisa!” Em relação ao dedão, eu já não tinha tanta certeza de que ele não tivesse quebrado. O que eu fiz? Lembrei que tinha uma festa open bar me esperando, tomei um dorflex, coloquei meu único sapato de salto muito alto, vulgo “sapato de casamentos e formaturas” e fui para festa.
No outro dia minha cabeça e meu dedão latejavam. Ignorei o dedão. Tratei a ressaca. O pobre nunca mais foi o mesmo. Às vezes ele inchava e eu reclamava da dor no dedão da patente. Há poucos anos descobri que naquela noite eu acabei com os ligamentos. Fiz fisioterapia. Depois daquele casamento meu dedão nunca mais foi o mesmo, nem a amiga que casou com o chato.

Malvina de Castro Rosa é de Porto Alegre. Escritora, relações públicas e mestra em design estratégico, publicou os livros As loucas aventuras da guria maluca (crônicas, 2013), Paralelos Cruzados (2021), seu primeiro romance, e Crônicas de um fim do mundo antecipado (2023), no qual reúne crônicas do blog semanal que mantém há mais de quatro anos, www.bomdiasociedademachista.blogspot.com. Em 2024, lançou a coletânea de contos Em nós. Atualmente, é editora assistente na Caravana Grupo Editorial, no Brasil, e editora-chefe da Caburé, na Argentina, além de conselheira da revista Vinca Literária.