CARTA PARA HANS CHRISTIAN ANDERSEN: Fernando Rocha

 
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Ilustração:  Edvard Eriksen,
 Sr. Andersen,
Infelizmente eu não te conheci na minha infância, só pude ler-te já adulto, mas isso não alterou em nada o poder das tuas narrativas sobre a minha pessoa. É engraçado como mesmo tendo nascido mais de dois séculos depois do senhor, eu aqui no Brasil, você (acho que já temos intimidade para parar com as formalidades) na Dinamarca, fragmentos do meu eu estão lá nos seus contos.
Num dia de tristeza fiz como aquela menininha. Acendi alguns fósforos para obter alegrias vindas de possíveis alucinações, mas vi sombras horríveis monstros com dentes afiados e garras grandes. Preferi o escuro, o frio aqui, num país tropical não mata, machuca mesmo é a frieza, mas esta vem da gente, aí não dá pra contar com meteorologista para prever, talvez um filósofo romeno que nasceu um século depois de ti ajude.


Aquele soldado alucinado, olhando para amada e projetando uma ilusão, que triste destino! Se é que isto existe! A falta de uma perna e um coração pesado demais: Desequilíbrio.
Liberdade, um pássaro só consegue cantar se gozar deste estilo de vida, mas a autoridade do Imperador, com aquela mania de controlar e ter seus desejos concretizados por meio de suas ordens. A tecnologia não compete com a natureza, onde não há pecado e nem perdão, como escreveu um baiano.
Em tua obra o menor tem força diante do gigante, mas vejo que o menor é uma massa gigante que se habituou a ser pequeno, para obter colo de um padre, pastor, professor, chefe, partido político. Desculpe-me, mas aqui no século XXI, poucos querem a liberdade, os que a conquistaram moram nas ruas ou estão em instituições para doentes mentais. O imperador anda nu e as crianças aprenderam a eficácia da hipocrisia.
O Cisne é a minha fascinação, descobri que a Sra. Lispector também gostava muito dele, eu até escrevi duas estorinhas dialogando com ele, espero que não se sinta ofendido, juro que fiz o meu melhor, mas esta não é uma boa medida, é?
Vou parar por aqui, talvez, aí no além-vida, não seja necessário o Google tradutor, todas as palavras daqui, cheguem aí traduzidas na língua única do início, ou melhor, no silêncio de antes de tudo, aquele da sua infância com o teatro de marionete dado pelo teu pai.


Fotografia de Fernando Rocha:  Fernando Mozer  @nandou      


Fernando Rocha é paulistano, nascido em 1981, graduado em Letras, professor  na rede municipal de São Paulo, autor do livro de contos Sujeito sem verbo (Confraria do vento), da novela Os laços da fita (Penalux) e Afetos (Penalux). Tem um conto na antologia Descontos de fadas (Alink) e Pouca pele (Alink). Possui textos publicados nos portais: Mallarmagens, Amaité Poesias & Cia, Diversos e afins, Revista Gueto, Incomunidade, Letras Inacabadas e Letras et Cetera. Participou da mesa Literatura e saúde, na FliCristina 2017.

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