LUAS DE MAÇÃ – JANDIRA ZANCHI



CONFINS
gotas, gotas escorrem da pedra nua
fina, fascinada, faminta da erva doce
que se enreda nos galhos do dia quando,
porque não, magnífico, abre seus arcos azuis
de horizonte e, leve, brando e astuto
é namorado dessas distâncias brancas e afins
mares gelados que a si bastam com seu deserto
de nuvens e flores nos confins da translação.


UVAS ESCURAS
fatigada do front
barreira
baú de lágrimas e lisonjas
caem como uvas escuras
aos pés de bentos
bonifácios duendes
formosa a manhã no paço.


REPORTAGENS
no complexo das palavras
sem face ou nexo
amplexo de minha ambivalente
necessidade de armazenar
ou criar
fios e fascículos
de imagens


reportagens  do ser.



PALMARES
folhas vão cair
aleatórias em suas passagens
agridoces de melancolia
palmares de servidões avolumam os dias de meia lua
amolecidos do sorver contínuo das lágrimas da noite
empobrecidos, em suas rimas, da cadência, constante
sonífero sonho palmilhado de nascentes
versos, ainda puídos do fulgor primeiro da consciência
se esparramam , beatificados, de deus e da luz!


ELDORADO
os acordes da subjetividade não esperavam pelo tempo e seu silêncio
quando acordei era quase hoje
esta manhã livre de cânticos e promessas
corrida pelo ouro  em um pomar de cravos e náuseas
agradeço, pelo menos, esse fim de rosas e gatos
já esqueço mentiras e perjúrios para pegar um trem
ou um laço
para outro lado
novas terras e eldorado
aqui não se falam mais esses nomes esses anjos. 


EXCLAMAÇÕES
a calma principiou por esses dias e não sei se foi de uma síntese
que imprimi ao meu desejo e à minha sombra
ou se   fluída de um canto do céu por um desses humores de anjos que persistem em suas flautas e harmonia
a alma floresceu em uma dessas tarde de agosto de inesperado calor e pouca umidade e muita serenidade
talvez distraída dos entes e serpentes com quem conversa
e supõem na ausência de suas estrelas brancas
sem juramentos  deslizo para a superfície ausente de interrogações
exclamações  sem pontos finais – vi uma estrela  nessa noite. 


LUAS DE MAÇÃ
teus olhos selvagens se apagam  em imagens
até o gélido norte  das luas de maçã
os círculos de fogo amanhecem sua lenda
para conter uma centena de estrelas
e um pedaço de cosmos e alvarás
enquanto, ali, no azul macerado de algum amanhecer,
um ponto de sol aponta a brevidade da tua eternidade.


Galeria: Jean Paul Bourdier
Jandira Zanchi é poeta, ficcionista e editora (singularidade). Atuou no magistério no ensino de matemática e física em faculdades, colégios e cursos. No final dos anos 80 foi professora cooperante na Universidade Agostinho Neto – Faculdade de Ciências, Luanda – Angola. Em Curitiba por cerca de dez anos esteve na FAE – Bussiness School.  Publicou o livro de contos Egos e Reversos (singularidade, 2018) A Janela dos Ventos (singularidade, 2017),  Área de Corte (Editora Patuá,2016), Gume de Gueixa (Editora Patuá, 2013), Balão de Ensaio (Editora Protexto, 2007) . Entre outras antologias participa de Saciedade dos Poetas Vivos vol 1, Poesia para mudar o mundo vols. I e II do site Blocos Online, organizadas por Leila Míccolis,  e 101 Poetas Paranaenses-antologia de escritas poéticas do século XIX ao XXI, (Selo Biblioteca Paraná, 2014), organizada por Ademir Demarchi. 

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