Na ternura das horas – Tere Tavares

Rosas difusas – arte digital- 2018



Não sei exatamente a causa de tudo ter mudado. Nem de como tudo ficou mudo. As horas que se estilhaçam pelos filamentos cósmicos me dizem que não há sonho mas o lábio a desentristecer-se em resquícios de uma lua desaparecida como os anéis de Saturno. Era como um pêndulo na renúncia da sombra. Há histórias que me fazem acordar que me mantêm acordada como se eu fosse permanentemente insone.Nada mais importa. Avalio o que de mim é próximo. O próximo em mim. Contemplo o silêncio sem rosto e sem calma. Nada é aferível. Tanto sol nessas maçãs. Entretanto é a emoção que as deixa rosadas. Observo o círculo da vida que estremece num universo antecipado. Amando o festejo do meu próprio riso. Sou ou fui ainda que em resquícios como as orquídeas.  A forma de amar e sentir a coerência determinante a condição incontaminável. Acho que poetizo tudo. Ou o contrário. Jamais conseguirei expressar adequadamente a densa harmonia da Natureza que a tudo contém.


Rosto I – Arte Digital – 2018

No fundo ele só quer conhecer o céu. O pobre cansado de rastejar!Baseado em fatos fortes e reais. Situa-se entre signos e sigilos com as letras entoadas pelos pássaros.“Sabes que agora me dás um olhar que eu não tive para subverter aquela náusea inevitável? As palavras. Essas brotações insistentes! Como se escrevesse uma rosa no gelo um cisne na bruma para empenhar-me a trazer felicidade aos que se recostam no reluzir das coisas irretratáveis. Como se meu corpo estremecesse a cada oportunidade que me possibilite emocionar sendo emoção ou uma história para preencher maços de uma grafia ininterrupta e absurdamente solitária caminhante pedinte no tempo intocável e enigmático. Sobrando-me a umbra arável e extrema. Fazem-se ausentes os passos de prata o perdão clarificado. O meu sempiterno e inequívoco fim”. 



Dança -Arte Digital – 2018

Passou-se o dia moroso e inapreensível. Não me prostro de todo porque tenho asco à covardia. Insisto. Vivo o que me é possível e transpasso como aço o que me é subtraído não sei por que mal ou bem. Pelo que se chama Deus Destino Desdita Felicidade Jornada. Por agora colho esse nada. Amanhã retorno. Espero contar algo mais belo que a própria beleza.


Extraído de  “Na ternura das horas”.
Ilustrações: Tere Tavares



Tere Tavares é pintora e autora de sete livros: Flor Essência (2004), Meus Outros (2007), Entre as Águas(2011), A linguagem dos Pássaros (Editora Patuá 2014), Vozes & Recortes (Editora Penalux 2015), A licitude dos olhos (Editora Penalux 2016), Na ternura das horas (Editora Assoeste 2017). Participou de antologias, jornais e sites no Brasil e Exterior.

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