
Depois de uma baixa na população de pets da casa no final do ano passado, resolvi adotar uma nova gata. Meu marido deixou bem claro que não via necessidade nenhuma em termos outro bicho de estimação, mas foi voto vencido. Talvez, não considerado. Eu considero gatos quase como seguranças pessoais, dada a minha fobia de ratos (eca!). Demorei um pouco para encontrar a gatinha. Decidimos que pegaríamos uma fêmea, preta, filhote recém-desmamada (pra ser mais fácil a inserção na comunidade familiar). Depois de um tempo a gata de uma conhecida deu cria e lá estava nossa filhote que já tinha até nome: Bonbon, afinal já temos a Petit Gateau e é necessário manter coerência nos nomes dos pets. A ideia era buscar ela quando desmamasse, com 45/60 dias, em uma comunidade na periferia da cidade.
Quando Bonbon completou 30 dias, nos pediram para buscá-la, porque a mãe gata havia sido atropelada; passava bem, mas sem condições de amamentar. Lá fomos, eu e as crianças, em busca da nossa gata. Chegando na casa onde Bonbon nasceu, descobrimos que ela era tão periférica que sua mãe havia sido atropelada por uma viatura, em um caso de violência policial animal, ou animal policial, não sei ao certo. Bonbon ainda que com a grafia francesa é quase um retrato do Brasil.
A gatinha chegou em nossa casa e decidiu que dormiria com meu marido, aquele voto contra sua vinda, numa clara tentativa de tentar ganhar o carisma do adversário. Passado uns dias de Bonbon em nosso lar, começamos a ter dúvidas se ela era de fato uma gata, talvez fosse gato. Um amigo sugeriu que a chamássemos de gate para evitar confusões. Nosso feline crescia lindamente, tratade com Pet Milk, que é Nan para gatos. O moço do Pet que nos vendeu o composto que imita o leite materno das gatas (egípcias, possivelmente, considerando o preço do negócio), nos disse para alimentar elu com isso até os 45 dias. Estávamos quase atingindo a data de passar gate para ração e também levarmos na consulta veterinária, quando Bonbon começou a apresentar certa desorientação pela manhã. Um dia elu teve muita dificuldade para acordar, achei estranho, mas melhorou ao longo do dia e ficou agindo como gate filhote normal. Na manhã seguinte tentei acordá-lu, e nada. Quando finalmente despertou estava completamente desorientade, andando encostade pelas paredes, miando estranho.
Levamos elu em uma consulta de emergência. Gastamos todos os reais para descobrir que Bonbon estava hipoglicêmique, duas semanas depois de descobrir que meu marido estava com a glicose alta. Elu: gate, franzine, prete. Ele: homem, alto, loiro/ruivo. Opostos intrinsecamente ligados (na vida conjunta que eu os obriguei a ter), praticamente Yin e Yang. Aproveitamos a consulta para descobrir se afinal Bonbon era ela ou ele. Três veterinárias examinaram e não chegaram a conclusão nenhuma, apenas que temos feline hipoglicemique. Aos que acreditam em alguma coisa, orem pela saúde da minha conta bancária. Começo a ficar temorosa de ter adotado jaguatirique achando que era uma gata.

Malvina de Castro Rosa é de Porto Alegre. Escritora, relações públicas e mestra em design estratégico, publicou os livros As loucas aventuras da guria maluca (crônicas, 2013), Paralelos Cruzados (2021), seu primeiro romance, e Crônicas de um fim do mundo antecipado (2023), no qual reúne crônicas do blog semanal que mantém há mais de quatro anos, www.bomdiasociedademachista.blogspot.com. Em 2024, lançou a coletânea de contos Em nós. Atualmente, é editora assistente na Caravana Grupo Editorial, no Brasil e editora-chefe da Caburé, na Argentina, além de conselheira da revista Vinca Literária.
Instagram @malvina.rosa
Uma resposta
Mais um para a tua coleção de “baita texto”! Bj