A BOCA SANGRADA
A arquitetura da fé
que move
a raça,
Transborda
taças,
retrai escudos.
Fé que não se sacia,
não dorme,
Ignora os vivos,
disseca os mortos.
Não sabe
das teias,
dos muros
rompidos.
Da lama
do poço,
ancestral veio.
Dos portos,
do que a mágoa
aborta,
Da moça de branco
algodão
Que habitava
o portal.
Não sabe da ciranda
dos cristais, do carbono,
da luz que se insinua
no breu
e morre em verde hora,
na boca sangrada
da espécie humana.
que move
a raça,
Transborda
taças,
retrai escudos.
Fé que não se sacia,
não dorme,
Ignora os vivos,
disseca os mortos.
Não sabe
das teias,
dos muros
rompidos.
Da lama
do poço,
ancestral veio.
Dos portos,
do que a mágoa
aborta,
Da moça de branco
algodão
Que habitava
o portal.
Não sabe da ciranda
dos cristais, do carbono,
da luz que se insinua
no breu
e morre em verde hora,
na boca sangrada
da espécie humana.
A FÁBULA
O ácido do crepúsculo
comia nozes
nos vãos do telhado.
Eu era cria
de um morcego muito velho,
que sabia assoviar
imitando o vento.
Longe do mar
eu sangrava
uma concha desabitada
e cultuava
a chama azul
de seda e lírios.
Silo de água nas palmas,
o gosto do sal
adornava o amor ateu,
mortal, residual veneno
nas papilas
que sonhavam
androceu e gin.
A velha que mora em mim
vasculha o antigo forro.
Busca o morcego
pra lembrar do vento.
O ácido do crepúsculo
comia nozes
nos vãos do telhado.
Eu era cria
de um morcego muito velho,
que sabia assoviar
imitando o vento.
Longe do mar
eu sangrava
uma concha desabitada
e cultuava
a chama azul
de seda e lírios.
Silo de água nas palmas,
o gosto do sal
adornava o amor ateu,
mortal, residual veneno
nas papilas
que sonhavam
androceu e gin.
A velha que mora em mim
vasculha o antigo forro.
Busca o morcego
pra lembrar do vento.
Em debandada,
as pétalas ex-brancas,
as cortinas, os lençóis
postos a quarar.
Anil e sol
expurgando a semana,
o susto, o gosto,
o fantasma exposto
pela transversal fratura
Anônima, reparto
flores de Espanha
e do Cabo
com o espectro
(ínfima fagulha),
rastros sob os meus
na velha casa da Vila.
Ainda sobrevivem
as memórias calosas
sob o sol de extinto maio.
Fervem a esperança
e o zelo em calda
dos sessenta,
as febres e raízes
dos setenta
ao som de solos
em sol.
as pétalas ex-brancas,
as cortinas, os lençóis
postos a quarar.
Anil e sol
expurgando a semana,
o susto, o gosto,
o fantasma exposto
pela transversal fratura
Anônima, reparto
flores de Espanha
e do Cabo
com o espectro
(ínfima fagulha),
rastros sob os meus
na velha casa da Vila.
Ainda sobrevivem
as memórias calosas
sob o sol de extinto maio.
Fervem a esperança
e o zelo em calda
dos sessenta,
as febres e raízes
dos setenta
ao som de solos
em sol.
AS ARMAS
Estende-se o vírus das armas.
As chamas queimam
as águas da febre
interrompendo crisálidas
– seda breve.
Havia um mar vermelho
nos sonhos dos profetas.
E a costura de uma estrela
híbrida, não manifesta,
jurava de morte o destino
dos filhos da guerra.
Letais cardumes
domesticando esqueletos
de esquecidos naufrágios,
de barbatanas de veneno e prece,
arrebentavam
as escotilhas de sal.
A matilha segue
o curso dos algozes.
Na praia,
um gosto de mortalhas
de cinzas e rosas negras
enfeitando
as bocas das meninas.
Estende-se o vírus das armas.
As chamas queimam
as águas da febre
interrompendo crisálidas
– seda breve.
Havia um mar vermelho
nos sonhos dos profetas.
E a costura de uma estrela
híbrida, não manifesta,
jurava de morte o destino
dos filhos da guerra.
Letais cardumes
domesticando esqueletos
de esquecidos naufrágios,
de barbatanas de veneno e prece,
arrebentavam
as escotilhas de sal.
A matilha segue
o curso dos algozes.
Na praia,
um gosto de mortalhas
de cinzas e rosas negras
enfeitando
as bocas das meninas.
O INCRIADO
A destra do meu poema
lambe a saliva do rio
pra guardar o gosto.
Caminho sobre um fio
de coração.
Arrombo as janelas do vento
e piso arrozais
em seus sonhos de brancura.
Encilho pássaros improváveis,
amarro seus dorsos
de impossibilidades
e de cruzes
onde se extinguem.
Eu chamo pelos mortos,
pelos vivos,
pelos fartos.
E dos incriados
recebo a herança do que não é.
Água viva – latejar e funda
fragmentando sangas.
Terra e revoada,
um pouco mais,
um nada.
Não sei se bendigo
ou nego.
Rendo meu voo
aos braços do adverso.
A destra do meu poema
lambe a saliva do rio
pra guardar o gosto.
Caminho sobre um fio
de coração.
Arrombo as janelas do vento
e piso arrozais
em seus sonhos de brancura.
Encilho pássaros improváveis,
amarro seus dorsos
de impossibilidades
e de cruzes
onde se extinguem.
Eu chamo pelos mortos,
pelos vivos,
pelos fartos.
E dos incriados
recebo a herança do que não é.
Água viva – latejar e funda
fragmentando sangas.
Terra e revoada,
um pouco mais,
um nada.
Não sei se bendigo
ou nego.
Rendo meu voo
aos braços do adverso.
A COR AMARELA
A lembrança
que ficar de mim
seja
a de uma cor
desfeita
em amarelos,
a de um som
que se perdeu
dentro do sino.
Os meus pés
pairem
sobre ossos
e inspirem
um criadouro
de silêncios,
de flores
brancas
enroscadas
sobre o musgo,
prenúncios
do tronco
roto,
do cheiro
do que chora
a lua
quando vaza.
Memória
transformada
na doce
calda
do tempo,
desafiando
os olhos,
seus dois cristais
turvos
subindo,
escalando
os furos
que a broca
desenha
– paciência
e arte
de presumir
o fim.
Antes
que se aquiete
e esfrie
o sangue,
o mágico fio
do esquecimento
forme a teia
que me enrede
e teça
um casulo
azul
no véu
do Tempo.
que ficar de mim
seja
a de uma cor
desfeita
em amarelos,
a de um som
que se perdeu
dentro do sino.
Os meus pés
pairem
sobre ossos
e inspirem
um criadouro
de silêncios,
de flores
brancas
enroscadas
sobre o musgo,
prenúncios
do tronco
roto,
do cheiro
do que chora
a lua
quando vaza.
Memória
transformada
na doce
calda
do tempo,
desafiando
os olhos,
seus dois cristais
turvos
subindo,
escalando
os furos
que a broca
desenha
– paciência
e arte
de presumir
o fim.
Antes
que se aquiete
e esfrie
o sangue,
o mágico fio
do esquecimento
forme a teia
que me enrede
e teça
um casulo
azul
no véu
do Tempo.
Ilustrações: Leonora Carrington
Rosa Maria Mano: nascida em São Paulo, onde vivi até os quarenta e um anos, com breve intervalo de cinco anos de residência na cidade do Rio de Janeiro, vivendo hoje à beira-mar, na cidade de Rio das Ostras, Rio de Janeiro. Curso de Letras interrompido no 4º período, São Paulo, atualmente, licencianda em História pela Universidade Estácio de Sá.
Atividades como escritora:
A primeira publicação, em São Paulo, uma coletânea de poemas sob o título Fruto Mulher, do qual participaram Mara Magaña, Maria Elizabeth Cândio, Maitê do Prado, entre outras.
Em 1983, Xamã, primeiro livro de poesias, individual. Com capa de Elifas Andreato e prefácio de Antonio Houaiss.
Participação na coleção Passe Livre, da Cia. Ed. Nacional, com o título Três Marias e um Cometa. Desta coleção participaram nomes como Pedro Bloch, Helena Silveira, Josué Guimarães, Fausto Wolff, Moacir Scliar, entre outros.
O Gato, Conto , 1998, D.O. Leitura, São Paulo
Coletânea Prêmio SESC de Poesia, 2000, Editado pelo SESC, Rio de Janeiro
Vento na Saia, poesia, 2015, eBookAmazon/Kindle
Manuscritos de Areia, 2017, poesia, pela Coleção Marianas, Ed. Marianas Edições/Bolsa Livro, Curitiba
Lábios-Mariposa, poesia, 2017, pela Singularidade Editora, Curitiba
Coletânea II Conexões AtlânticasBrasil-Portugal, poesia, 2018, julho, Lisboa, Portugal, Lisboa
Participações
Premiada no Concurso de Poesia do SESC, Rio de Janeiro, 1999, tendo A Lua Negra em primeiro lugar na fase municipal (Teresópolis) e segundo na premiação final, na cidade do Rio de Janeiro. Ainda, segundo lugar em Teresópolis com Re(s)cendência, no mesmo concurso.
Vencedora do I Concurso de Escrita Criativa, nas três categorias, Editora LiberUm, 2016