6 poemas de Maria Emanuelle Cardoso



chicletes tutti-frutti
 
andar sempre na ponta dos pés
descalça e silenciosa
sem olhar para os Reumatismos
não se pode despertar os Nomes
todos sob o tegumento de charcutarias
quieta, cada vez mais quieta
imóvel, translúcida, intocada
como a saudade grotesca das cristaleiras
podes beber nos meus copos
esta poeira na superfície
é do acúmulo de olhos
 
 
mesmo crescer no escuro é ir em direção à luz
 
tudo é pequenino,
para ver é necessário arregalar os olhos,
roubar o rosto do tempo
como quem pesca tamarindos
para com os dentes quebrar sua casca
e com a garganta chupar fortemente
seu sumo azedo
até subirem as canelas
múltiplos caules de muriçocas
 
 
algas vermelhas
 
na primeira vez que entrei no rio
fechei os olhos e mergulhei profundamente
fiquei com gosto de areia e sangue na pele
passei então
a mergulhar como quem para a noite se despe
não completamente, apenas o suficiente
sabendo que tanto na noite quanto no rio
a Areia sempre vem
 
 
respiração de bicho forte
 faz ferida nas paisagens 
 
alguns arqueólogos acreditam 
que a idade das pedras lascadas 
trata-se na verdade da idade das 
pedras estilhaçadas a mudança se 
dá porque acreditam que os primatas 
não lascavam com atrito de lagarta 
pedra por pedra e sim com os estilhaços 
da queda faziam suas lanças.
lançaram o  artigo com o título: fazer armas 
com os estilhaços
que nos caem


namazu 
 
os peixes-remo medem aproximadamente seis 
metros. quando aparecem, dizem aos japoneses 
que é tempo de terremotos. a gramática diz: 
sua saída causa terremoto. o beiço diz: o terremoto 
causa sua saída. hoje, quando se vê um peixe-remo 
sabe-se que é tempo de terremotos e tsunamis. 
as relações da causa e consequência do influxo 
e efluxo de humanos, por outro lado, ainda não 
são totalmente conhecidas. há quem diga 
que todo humano é prelúdio de incêndio. 
há quem acredite que toda carbonização 
é prelúdio de humano. não se sabe se houve 
guerra porque existem humanos ou existem 
humanos porque houve guerra. 
aos humanos quando os vemos 
resta contar a lenda de um primata que corre como 
planta se esconde como pirilampo contempla kintsugi 
e sabe como provocar terremotos


da possibilidade de encontrar 
um psitacídeo intergaláctico
 

 os grandes mamíferos das águas que são pescetarianos
 não tomam coca, querem mergulhar
 reduzir o consumo de coca ainda é produzir coca
 tomar coca light ainda é produzir coca
 reutilizar o vidro de coca ainda é produzir coca
 reciclar o vidro de coca ainda é produzir coca
 a pele do capitalismo adora esse tipo de cócegas
 tomar nenhuma coca ainda é produzir coca
 queimar queimar
 a fábrica de cocas




Maria Emanuelle Cardoso nasceu em Montes Claros, Minas Gerais, em 15 de novembro de 2000. Graduada em Ciências Biológicas, Bacharelado, na Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) em 2023, atualmente cursa o mestrado em Biodiversidade e Uso dos Recursos Naturais (PPGBURN) na mesma instituição. Além de bióloga, é poeta e educadora popular. Realiza pesquisas na área de etnoecologia, com ênfase no campo de redes de troca de sementes e mudanças climáticas. Seu livro de estreia amarelo mostarda foi publicado em 2024 pela editora Nauta. Tem poemas publicados em mais de 50 antologias e revistas em português, inglês e espanhol. Ganhou o segundo lugar do Prêmio Poesia Agora Verão 2021 (Trevo) e participou do Clipe Poesia 2023 na Casa das Rosas.

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