
chicletes tutti-frutti
andar sempre na ponta dos pés
descalça e silenciosa
sem olhar para os Reumatismos
não se pode despertar os Nomes
todos sob o tegumento de charcutarias
quieta, cada vez mais quieta
imóvel, translúcida, intocada
como a saudade grotesca das cristaleiras
podes beber nos meus copos
esta poeira na superfície
é do acúmulo de olhos
mesmo crescer no escuro é ir em direção à luz
tudo é pequenino,
para ver é necessário arregalar os olhos,
roubar o rosto do tempo
como quem pesca tamarindos
para com os dentes quebrar sua casca
e com a garganta chupar fortemente
seu sumo azedo
até subirem as canelas
múltiplos caules de muriçocas
algas vermelhas
na primeira vez que entrei no rio
fechei os olhos e mergulhei profundamente
fiquei com gosto de areia e sangue na pele
passei então
a mergulhar como quem para a noite se despe
não completamente, apenas o suficiente
sabendo que tanto na noite quanto no rio
a Areia sempre vem
respiração de bicho forte
faz ferida nas paisagens
alguns arqueólogos acreditam
que a idade das pedras lascadas
trata-se na verdade da idade das
pedras estilhaçadas a mudança se
dá porque acreditam que os primatas
não lascavam com atrito de lagarta
pedra por pedra e sim com os estilhaços
da queda faziam suas lanças.
lançaram o artigo com o título: fazer armas
com os estilhaços
que nos caem
namazu
os peixes-remo medem aproximadamente seis
metros. quando aparecem, dizem aos japoneses
que é tempo de terremotos. a gramática diz:
sua saída causa terremoto. o beiço diz: o terremoto
causa sua saída. hoje, quando se vê um peixe-remo
sabe-se que é tempo de terremotos e tsunamis.
as relações da causa e consequência do influxo
e efluxo de humanos, por outro lado, ainda não
são totalmente conhecidas. há quem diga
que todo humano é prelúdio de incêndio.
há quem acredite que toda carbonização
é prelúdio de humano. não se sabe se houve
guerra porque existem humanos ou existem
humanos porque houve guerra.
aos humanos quando os vemos
resta contar a lenda de um primata que corre como
planta se esconde como pirilampo contempla kintsugi
e sabe como provocar terremotos
da possibilidade de encontrar
um psitacídeo intergaláctico
os grandes mamíferos das águas que são pescetarianos
não tomam coca, querem mergulhar
reduzir o consumo de coca ainda é produzir coca
tomar coca light ainda é produzir coca
reutilizar o vidro de coca ainda é produzir coca
reciclar o vidro de coca ainda é produzir coca
a pele do capitalismo adora esse tipo de cócegas
tomar nenhuma coca ainda é produzir coca
queimar queimar
a fábrica de cocas
Maria Emanuelle Cardoso nasceu em Montes Claros, Minas Gerais, em 15 de novembro de 2000. Graduada em Ciências Biológicas, Bacharelado, na Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) em 2023, atualmente cursa o mestrado em Biodiversidade e Uso dos Recursos Naturais (PPGBURN) na mesma instituição. Além de bióloga, é poeta e educadora popular. Realiza pesquisas na área de etnoecologia, com ênfase no campo de redes de troca de sementes e mudanças climáticas. Seu livro de estreia amarelo mostarda foi publicado em 2024 pela editora Nauta. Tem poemas publicados em mais de 50 antologias e revistas em português, inglês e espanhol. Ganhou o segundo lugar do Prêmio Poesia Agora Verão 2021 (Trevo) e participou do Clipe Poesia 2023 na Casa das Rosas.

Respostas de 2
Poemas bem autorais, com estilo próprio e marcante, de excelente qualidade.
Gostei de ler. Utiliza um espectro lexical incomum, o que traz aos poemas alguma frescura, ou como chamaram os Formalistas russos a este recurso: alguma estranheza.