Num tempo sem relógios
Sim bebi de suas águas
Comi de suas terras
Resgatei alguns objetos
Comi de suas terras
Resgatei alguns objetos
Sempre depois da chuva
Quando o trator feria
O miserável chão do pasto
E toda noite eu os ouvia
Quebrando as pedras
Mas era eu ali trabalhando
Milênios sob meus pés.
Última instância
só escrevo
minhas perdas
minhas perdas
quando
não tenho mais
onde guarda-las
Ternura
Amo quando
os olhos
brilham…
os olhos
brilham…
e mesmo
em silêncio
a gente
não sabe
ou consegue
mudar
de assunto.
Escrevo
até que
um dia
olho o
um dia
olho o
espelho
e me
percebo
quatro
meses sem
: limpar
a casa.
Inverno
meu único
uniforme
de trabalho
uniforme
de trabalho
( quase
branco )
secando
atras
da geladeira
que
não tenho
Crescente
– Papai, papai
a lua papai.
: Que tem a lua, neném?
– Tá quebrada…
: É mesmo?
– É, mas se você me der
as ferramentas…
: Que ferramentas?
– As de brinquedo, papai
eu conserto ela.
a lua papai.
: Que tem a lua, neném?
– Tá quebrada…
: É mesmo?
– É, mas se você me der
as ferramentas…
: Que ferramentas?
– As de brinquedo, papai
eu conserto ela.
Doméstico
minha
mãe
voltou
pro
interior
mãe
voltou
pro
interior
eu
mesmo
limpo
a casa
: varri
o lixo
pra
debaixo
do
poema.
Ilustrações: Taylan Soytürk

Wilson Guanais – Bastos, SP 1972. Mais de 10 livros publicados e participação em 150 antologias. Com a Penalux publicou os livros:Em noites de sol, De sonho e de lama, A casca da casca (ou o lado de dentro),Em branco silêncio.