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Ilustração: Odilon Redon |
UMA HISTÓRIA
Não posso trazer de longe a casa que tinha
a cristaleira com vidros bordados,
as flores ensopadas de colorido,
e a altivez de uma garça muito branca
que apelidei de Maria Elegância.
Nem uma pena de Maria voou
para dentro dos bolsos quando deixei a casa.
Hoje quando fecho os olhos,
posso imaginar cada tijolo,
e o sol que ficava ali, no número 11.
Do mundo adquiri contas a pagar.
E Maria Elegância é só uma ternura antiga.
UM RIO FUNDO
Porque dei importância à única batida diferente
deste coração,
urge que eu desate o nó.
Reina um grão de significados
que ainda cortejam minha carne,
em meio a cactos e ritos.
Conjugar o verbo amar com plenitude
sempre foi a voz que mais grita.
MORANGOS E SOLIDÃO
Na meia-luz da varanda uma noite não dorme
A mulher fala ao telefone serena de solidão
O vizinho devassa seu escuro
Tenho saudade de pirilampos e da mesa farta
de vestígios e bem-querer
Agora, há uma cadeira vazia e sobras de morango
na geladeira
Retiro da boca o batom
O ar com pena de mim abre seu guarda-chuva
O OLHAR MADURO DA ONÇA
Não se escreve um poema de amor impunemente
No desvão da noite uma onça perpetua a sombra de fogo
sobre teu caminhar espaçado.
Há uma súplica com os devidos ais prudentes,
A onça sabe onde derrama seus passos
Crava os dentes nesta carne que tem cheiro de batismo
o sangue suado de caça.
Que rara luz expressa teu corpo
A onça é aos poucos domesticável
Não se escreve um poema de amor inutilmente.
Não se escreve um poema de amor impunemente
No desvão da noite uma onça perpetua a sombra de fogo
sobre teu caminhar espaçado.
Há uma súplica com os devidos ais prudentes,
A onça sabe onde derrama seus passos
Crava os dentes nesta carne que tem cheiro de batismo
o sangue suado de caça.
Que rara luz expressa teu corpo
A onça é aos poucos domesticável
Não se escreve um poema de amor inutilmente.
LILA MAIA é maranhense e vive no Rio de Janeiro. Graduada em Pedagogia. Escreveu os livros de poemas: As Maçãs de Antes (vencedora do Prêmio Paraná de Literatura 2012 – Prêmio Helena Kolody de poesia), Céu Despido – 2004 (vencedora do II Prêmio Literário Livraria Scortecci-SP) e A Idade das Águas – 1997. Em 2013 ganhou o concurso literário Coleção Vertentes da Universidade Federal de Goiás com o texto infantil Caixa de Guardar Amor, e em 2015 ganhou o concurso literário da Universidade Federal do Espírito Santo com o livro de poemas para jovens O Coração range sob as estrelas.