J
Nem eram violetas de Verdi
Cindidas na manufatura
Cindidas na manufatura
De Giorgio Germont
Nem violas d’amore e seus
Olhos vendados e
Fendas eivadas em armas
Flamejantes
Nem versavam a
Voz chilena, o folclore
Advertido
Ou menos se atinavam
Do asteroide 557, dependurado
Na cintura orbital
Nem eram, especialmente
As violetas no vaso
Invioláveis
Nunca se afunilaram
Nos limites do jardim. Eram
As violetas no chão
Ao pé dos passantes
Ouviam as rodas da rua
Nenhuma gaiola — pássaros
Pousados.
L
1.
Dar de galocha no ouro:
As chances de Philip Pirrip
Por alto, eram baixíssimas.
E descabidas, um pouco:
Ou Estella virava outra
Ou seria um outro, Pirrip.
2.
São quantas mágicas o circo?
Esferas vermelhas se furtam
Naufragam, mas subitamente
Se multiplicam! — Similares
Às sílabas do amor há muito
Embargadas… E como é forte
Vigoroso, quantos ponteiros
Param durante os exercícios
Dos quadríceps do trapezista!
Eles enlouqueceram tantas!
Foi da habilidade acrobática?
Ou dos entalhos, do circuito
Da musculatura? De quantas
Petulâncias enlouquecidas
Armou-se a metodologia
Do domador das bestas-feras?
Qual bravura! Que atrevimento!
— Malabarista dos instintos
Almeja ser menos selvagem…
Na viril e delicadíssima
Arte do atirador de facas
Algo entre excitação e medo
Imobiliza a mulher-alvo:
É quando se deitam as flechas
Dessa incurável insensatez!
Mas ambição mesmo seria
Acender os cinco sentidos
A cada expressão. Ao menor
Suspiro, cuspir do calor
Que se desaperta no peito.
— Cuspidor de fogo, tua mágica
Murmura na melancolia?
3.
Abrir um livro
E em vez de histórias
O sobressalto dos
Cupins.
4.
A lona incandescente
Caía como gotas de fogo
O bombeiro bradava “quem está vivo levanta a mão”
A elefanta esmagou crianças e adultos, em
disparada
disparada
A elefanta salvou centenas ao
Abrir um rombo na lona incandescente
O país virou referência em cirurgia plástica
A mãe reclamou que os três chegaram
Sujos de fuligem
A sobrevivente conta que recebeu a extrema-unção
Voluntários enterravam os mortos em um
Cemitério construído às pressas
Um pequeno empresário obteve uma revelação divina
Deixou a mulher, quatro filhos
Virou profeta.
5.
Dar de galocha no ouro:
As chances de Philip Pirrip
Por alto, eram baixíssimas.
E descabidas, um pouco:
Ou Estella virava outra
Ou seria um outro, Pirrip.
T
Os quatro encapuzados
não mataram
não mataram
E rasuram sorrisos
num feedback.
num feedback.
The art of stealing isn’t hard to master
Nem é algo de todo
sem mistério:
sem mistério:
O mais bobo xereta
constrangido
constrangido
Meu celular, temendo
ir pro inferno
ir pro inferno
Enquanto o mais cruel
sorri da ínfima
sorri da ínfima
Quantia em cash (e logo
se encapota).
se encapota).
O bonitão vê o livro,
“Antonio Cicero”
“Antonio Cicero”
E se espanta pensando
no blackout…
no blackout…
O maioral, ao largo
do conluio
do conluio
Consegue ouvir seu
timing no relógio —
timing no relógio —
Pudesse ser a vez de
qualquer um!
qualquer um!
Os quatro encapuzados
não mataram.
não mataram.
V
Sono: duas
Borboletas pousadas
Em teu rosto.
Suas asas
Se acalmam desaceleradamente.
Z
Ao crestar o céu
A noite se alastra:
Tudo é substituído…
O sol verde das folhas pela paúra dos troncos
O barulho das borboletas pelo silêncio dos uivos
A sombra pelo vulto
A dor pelo sono. Cai
A cor do chão, laminada sob a lua.
Mas o mar, não.
Tudo é substituído menos
O mar, que morre.
Que desenha o nada
Entre a espuma e a espátula
Do horizonte:
O aposento de um filho perdido
É seu lugar vazio deitado
Na noite.
Poemas de O
AMOR CURVO(Editora Oito e Meio, 2018)
AMOR CURVO(Editora Oito e Meio, 2018)
Ilustrações: Dominique Dupray
Daniel Gil é poeta e ensaísta. Autor, entre outros, de O amor curvo (Oito e Meio, 2018);organizou recentemente livro póstumo de Vinicius de Moraes, Roteiro lírico e sentimental da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro (Companhia das Letras, 2018). É secretário executivo da UFRJ, onde conclui o doutorado em literatura brasileira;foi músico da Companhia Folclórica do Rio e atua eventualmente em pesquisas editoriais.