SEX-ART-APPEL
***
O coração de resina grane louco,
meu peito é um zoológico suspenso.
A sedenta voltagem das pernas riscando a noite,
tesão que rodeia a boca feito uma tourada cigana,
esse sexo embalando um marasmo elétrico,
angelical mas fugaz
como seus dedos quando mancham o A3.
Eu, além do real
em véu-vítreo
pulmão apalpando o ar carbonizado dos cigarros da fronteira,
devaneando
sentindo a ferida abrir feito boca
na fome felina de mundo,
que tenho
tenho,
em uma utopia-libertina
onde eu e meu bem imergimos sobre as cordilheiras
imensos
imensos
numa valsa incendiando as paredes do globo,
minando nossas cabeças no ponto de fuga.
Tudo
Tudo
A pele e o que há:
casca, vazio.
Esse tempo em que daninhas fermentam sobre nós
e sonhos forram o parapeito,
o que a arte entrega a morte não toma,
o mormaço da tua boceta me deixando alto
de olhos pintando o teto como uma capela sistina,
nosso amor concebido pelo o que seremos,
como unidade, como par;
como Deuses cegos de mãos entrelaçadas.
Sex-art-appel
cortinas se abrem
vidas desabrocham frescas
nasce aqui
o doce teatro dos nossos delírios.
LÍRICA-CRÔNICA-DO-AMOR-ESTRANGEIRO
***
Piás alucinados embriagam a tarde,
vejo lapidado teu rosto na superfície de estanho,
já não traço os dedos nas fluviais de tua mão,
tua falta impregnada nas esquinas da cidade
onde o vento em vão te procura os cabelos.
O corriqueiro estende-se entre tetos e bitucas,
pessoas preparam chá descompassadas,
convulsão de peitos rotos,
ansiedade
paixões desprevenidas
olhar
olhar
manto vivo em pele,
fagulhando a alma com os ponteiros
enquanto o lençol se dilui na miragem de um busto em quentura,
tu
o cheiro
tu
a vida trotea
em nosso coração que não perde o verniz.
SORTILÉGIOS DA MADRUGADA EM UM VIDRO MAGO
***
Sonhos oriundos esculpidos na noite
lascívia gotejada no lastro denso da cidade
onde putas são orbitadas nas rotatórias
a brasa
luzes
postes folheiam o cobre no asfalto
bêbados batizam ruas à suco de bexiga
demônios ronronam gases nas esquinas febris
há corpos assaltando xenon pelas dobras da carne
fervilhando tesão juvenil: doce baba noturna.
Dionísio assina sua onomatopeia nos motores
vozes ondulando o compasso –
as línguas são regidas por uma serpente carnavalesca.
A mecânica da madrugada te drena as têmporas
no lastro denso da cidade
no lastro denso
o caos te costura
amável tormenta dos bobos alegres bêbados
tropicando pés tropicais na valsa dos vencidos.
Musas acesas no cemitério das nossas lembranças – paixões desbotaram no acaso.
Levando nossos zumbis para passear na noite
pela brasa
pelas luzes
das nossas almas chupadas feito caracóis
somos o erro da matrix
somos sim
a sombra porosa de Deus.
JUNG ENCENOU O ARQUÉTIPO DE JUDAS
***
Quando eu estiver dormindo
Fure meus olhos, amor
na tua unha de descascar mexerica
e perceba dentro de mim
minha alma-trapilha
travestindo folgados-versos-meços-na-tua-medida
Fure meus olhos, amor
assopre
e veja que
saudade
saudade
saudade
é o que fica
mas note inside
que em mim
toda festa
é despedida
Quando eu estiver dormindo
Fure meus olhos, amor
benzendo benzina nas retinas
e assista no vitrô-negro dos meus olhos
a prévia do próximo sonho
no cine-psiquê-família
eu acordando assustado:
– O que foi filho meu?
[Uma pausa/
o suspiro]
– Assassinei Pai-Freud, mãe querida.
REC-BEAT-NIGHT
***
O pulso na rítmica dos motores,
essa noite
meu pensamento é um blues.
Dissecadas porções de mim
empanadas no pó do asfalto,
sou o cão-latino trincando o esqueleto no swing de vozes-noturnas,
a vida toda o naco
dessa atmosfera que destila adeus
e tira o ferro dos ossos.
A saudade que vela
na morte que acena.
Essa noite
meu pensamento é um blues
e exalo o fél dos poros
& não quero mais
que alguém pra me iludir.
Brisa nas ventas
flor-de-náusea na boca
a fantasia que asila
meu coração biscate.
Cru
cru é o século:
cadelas cozidas no próprio sangue
empoderando-se no cio
egos que regem a dança
no ventre da terra
brainshitstorm
& os eu’s-ogiva.
Essa noite
meu pensamento é um blues,
serena
navalhas nas mangas
putas estéricas roubam-me o sono
não me tome pela mão
de mim só resta o plasma
e meias-verdades.
O amor que tenho – na boca do bueiro o funil;
repeat de más fodas
asas de chumbo ornadas
na queda livre
de corpos sem fundo.
Essa noite
meu pensamento é um blues,
e minha alma-trapilha dá nota solta
face estampada na privada
solitário no reflexo
Não fuja de mim, Narciso Bêbado.
XAMÃNICA DO POETA MENOR
***
Eu ainda choro
assistindo casais de acrobatas
hereges-cadentes
quebrando leis no ar.
E acho, ainda hoje,
que na galeria púrpura da noite
quando grogue
não há coisa mais seduzente
que a luminosa da Coca-Cola.
Eu ainda me exilo em roxo dos meus confrades
se a poesia se enciuma
com seus artifícios e silêncios.
Quem sabe o que me mantêm
é esse abraço curto
na sua plástica
de singelo-divino
como harpa & querubim.
Eu, ainda morro em gotas
sentinela-da-soleira-do-mundo
com minha melopéia mal escrita
e minhas dores mal acabadas.
Querendo inventar
uma palavra-pura
forte e presente
feito uma prece
à Virgem de Guadalupe/
capaz de mover um país
[dínamo-lírico
trem-fonético]
explosão dos tímpanos parindo neo-luas.
Eu, ainda amargo
corto nu a face da lembrança
como se para fazer souvenirs
com colagem de revistas velhas
e me envaideço
com meus rancores
como uma árvore
em sua solitude anciã
se envaidece de seus frutos.
[Shiva zunindo em minhas paixões]
Eu ainda sou
essencial surrealista
montando maré-alta
para corpos à vela.
A espuma dos versos
produzindo colírios
na ótica poética
para visionários-de-rapina.
Canções da Província
à um poeta menor
com seus pecados
providos de caprichos,
nas mesmas temporadas
pervagando o destino
sobre as serpentinas
que brotam do olho.
Eu, frágil
ainda humano
enquanto a vida palmilha
entre o espaço
e o coração.
Ilustrações: Kyle Thompson
BIOGRAFIA
Portador de bílis negra.
Dono de uma varanda com vista para o implícito – olhar de vidro-fumê.
Falso curitibano, caiçara de vivência.
Fetiche em relva e fuligem.
A taquicardia é do coração de beija-flor.
A empreitada no espaço.
20 anos, lua em escorpião.
Poeta nas horas de sensações vagas.