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Ilustração: Alex Stoddard |
(À Cia. Coral Mawaca)
I
Quando canto projeto no futuro
cada som que eu desejo permanente.
Mesmo lançando a voz num tempo obscuro,
já me sinto soando lá na frente.
Quando canto eu sei que me aventuro,
pois soando me ligo no presente
de modo mais inteiro e mais seguro.
É na voz que carrego o que é urgente.
Nesse espelho dos tempos que é a vida,
eu sou um eco vago que convida
o agora a se encontrar com o amanhã.
São urdidas num cântico voraz
as longínquas memórias lá de trás,
levadas pelos ventos de Iansã.
II
Quando cantamos, nunca estamos sós.
Na voz levamos nossos ancestrais
e as canções que trouxeram para nós.
Passageiros do ar, são pelos ventos
conduzidos os sons inaugurais,
espelhos de folias e lamentos.
Eu ouço sedimentos de memórias
ressonando em escalas. Ouço vidas
que nos contam e cantam as histórias
que movem nossas forças incontidas.
Meu corpo é instrumento em que se abriga
tudo o que invoco e sinto que é sagrado.
Celebro assim, numa canção antiga,
as vozes e os cantores do passado.
Teofilo Tostes Daniel, escritor e poeta, é analista de comunicação do Ministério Público Federal. Formado em Produção Editorial pela UFRJ, é autor de Trítonos – intervalos do delírio (Patuá, 2015) e Poemas para serem encenados (Casa no Novo Autor, 2008). Publicou ainda contos, poemas e artigos, em coletâneas, revistas literárias e culturais. Mantém ensaios abertos com a palavra em https://teofilotostes.wordpress.com.