Frente fria – André Giusti

Ilustração: Weichuan Liu





Evitemos despedidas

Nessas tardes geladas e chuvosas
Em que a multidão deserta
Nos atravessa o peito
Na busca pela fuga das marquises.
São mais tristes as partidas
Com essa temperatura caindo lá fora,
Essa névoa ocultando terraços
Torres e antenas.
Torna-se mais bruta a lâmina
Do sumiço
e mais frio fica o sangue
Nisso tudo que se assemelha
A perder num golpe
O braço da mão com que se escreve.
Me dói
ter te ferido,
é um arrepender-se
que cresceu feito massa
cancerosa
de carne cinza amarronzada
com manchas leitosas
aimprensar pulmão
fígado
um dos rins.
Quisera encontrar
Que me operasse
O médium polêmico
O de arrancar com os dedos
Caroços do pescoço
Usando faca de cozinha
Tesoura de costura.
Suporto a casa vazia
Mas temo
enfrentar nas vitrines
Os vestidos que te cabiam nos meus sonhos.
Tenho Medo de que o tempo passe
Para sempre com essa chuva lá fora no meu mundo
Com esse caroço aqui dentro
Medo de saber o amor da vida inteira

No braço que perdi por minha culpa.






André Giusti nasceu em maio de 1968 no Rio de Janeiro e mora em Brasília desde a década de 90. Entre contos, crônicas e poemas, A Maturidade Angustiada (Penalux, 2017) e Os Filmes em que Morremos de Amor (Patuá, 2016) são seus livros mais recentes. Atualmente trabalha em seu primeiro romance. Também é jornalista. Mantém site e blog em www.andregiusti.com.br

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